Alcova
As alcovas eram cômodos recorrentes nas moradias luso-brasileiras do período colonial, caracterizadas por estarem localizadas no interior das residências e por não possuírem janelas que davam para a rua. A ausência de comunicação com o exterior restringia a entrada de luz e ventilação, fatores que, se hoje em dia nos causam estranheza, estavam em consonância com os paradigmas sanitários, espirituais e ideológicos da época – o recolhimento da vida mundana era um valor a ser alcançado, na medida em que propiciava a oração e a contrição, segundo os preceitos religiosos setecentistas. Ao mesmo tempo, acreditava-se que os ventos traziam miasmas e doenças, o que tornava as alcovas recintos adequados à convalescença dos enfermos.
Além disso, a arquitetura das alcovas estava ligada a um outro valor moral caro às mentalidades do período colonial: o confinamento feminino e o controle dos corpos. Enquanto as mulheres escravizadas eram consideradas propriedade dos senhores, estando sujeitas a todo tipo de abusos, as mulheres brancas eram propriedade de seus pais e maridos. Dessa forma as alcovas, também chamadas pela tradição oral de “quarto das moças”, eram cômodos muitas vezes destinados às jovens solteiras, que deveriam ter sua honra e castidade preservadas a todo custo. Separadas das tentações do mundo exterior e dos olhares curiosos dentro desses recintos, as moças estavam sujeitas à constante vigilância familiar.
Apesar da luta pela emancipação feminina que tem atravessado os séculos, observa-se que o recato e a submissão são ainda hoje valores constantemente associados à mulher e considerados desejáveis pelo patriarcado. O controle dos corpos femininos segue sendo imposto pela sociedade e pelo Estado, desde a indústria da moda até a criminalização do aborto. O padrão arquitetônico das alcovas, considerado insalubre segundo os preceitos da ciência moderna, foi abolido – elas, no entanto, seguem aprisionando, embora com paredes invisíveis.

Imagem de parte da alcova do casarão que abriga o Museu do Diamante.